A pequena garota O'Brien tinha os olhos da mãe e o sorriso do pai.

Seus olhos eram grandes, expansivos, azuis; dois oceanos sobre os quais resplandece o sol, brilhantes como joias a fulgir. Seu sorriso traz a luz aos dias cinzas e fulgura, alvo, com dois grandes dentes da frente. Sua risada melódica é contagiante, bem como sua alegria. Era pequena, mirradinha; sua altura jamais a incomodou. Gostava de ser chamada de chaveirinho e de ser levada de cá para lá com facilidade sob os braços do pai. Os cabelos eram loiros, verdadeiros fios d'ouro que cascateavam para seus ombros e que, quase sempre, prendia com uma bonita fita azul. A pele muito branca queima fácil ao sol e suas bochechas coradas têm sempre um tom de rosa. Tem predileção pelos bonés da Liga Pokémon, mochilas de acampamento e as jardineiras surradas que usava em sua cidade natal. Nos pés, sempre as mais estapafúrdias galochas: quanto mais ridícula a estampa, melhor.

Um doce de menina, mas muito delicada; não estava, então, pronta para as coisas da vida ou para a árdua tarefa de ser uma treinadora pokémon. No entanto, a boa filha dos O'Brien escondia sob seu sorriso alegre e sua primorosa empatia uma intensa vontade de viver e de se provar: havia algo no fundo de seus olhos que clamava por aventura. Apesar de ser muito gentil e bondosa, Maddie sabia seu lugar no mundo e sabia lutar por ele. Com unhas e dentes, ela se aferrava às oportunidades que lhe eram dadas e não as desperdiçava. Perseverante e disciplinada, embora, talvez, muito ingênua, deixava-se acreditar fácil nos outros e sua bondade a acabava tornando vulnerável àqueles que buscavam tirar proveito dessa inocência.

Nascida na bonita cidade das flores, Madeline crescera ouvindo histórias sobre aventuras e treinamento pokémon. Seu pai, um renomado pesquisador, trazia contos dos muitos hábeis mestres com que se deparara na vida. Os olhos de Madeline sempre se enchiam com a esperança dela, também, sair pelo mundo um dia e ter sua própria jornada, suas próprias histórias que contar para aqueles que quisessem ouvir. Sua família, no entanto, endossava aqueles sonhos como endossamos os de crianças que dizem que querem ser astronautas e ir à lua. Ninguém acreditava, de verdade, que um dia a pequena Maddie fosse pôr uma mochila às costas e desbravar o desconhecido.

Em sua cidade, na pequena casa que morava com os pais e a avó, Maddie tinha amigos pokémon: o pequeno Oddish de sua mãe, que ajudava com o jardim, o Arcanine do pai, que cuidava da casa e do portão, e o belo Persian de sua avó que se enroscava em suas pernas e lhe fazia companhia. A vovó Valya era sua maior alegria: ela era a única que acreditava no sonho da menina. Dizia sempre que o jeito com que ela lidava os pokémon que tinham ali era, também, o jeito de uma grande e promissora mestre e que seu sonho, inda na velhice, era ver sua querida neta na TV a entrar num daqueles grandes estádios, para vencer um torneio pokémon.

Valya jamais viu esse sonho realizado.

Uma daqueles noites de céu claro, enquanto dormia, o coração parara de bater. Maddie a encontrara de manhã, acreditando estar ainda em profundo sono. Os olhos se encheram de lágrimas, querentes de que a avó acordasse e lhe fizesse companhia outra vez. Vovó Valya jamais acordou.

Após o funeral, Madeline juntou suas coisas. O rosto ainda inchado e vermelho, os olhos ainda molhados, ela pôs o que tinha e provisões em uma de suas adoradas mochilas. Resolveu partir, assim. Fora encontrada pelos pais já do lado de fora de casa. "Não vou voltar! Vou cumprir o que prometi!", fora seu grito àquela feita. Os pais disseram que não a impediriam, se era isso mesmo que queria, mas que não a deixariam ir assim, sem lenço no bolso e sem chapéu. Fizeram-na voltar para casa, a abençoaram com suas graças, sustiveram-na com dinheiro e provisões.

Na despedida, fora abraçada firme por sua mãe e pai. Chorara, copiosa, em seus ombros, mas não olhara para trás quando decidira partir. Havia um mundo diante dela, as memórias de um sorriso e o sonho de ser a melhor que já existira. Ela seria uma treinadora em honra a sua avó e aos seus próprios desejos; que o mundo a acolhesse, então.